Retrato


A chuva caia tão fininha e manchava a tarde de cinza. Nem se ouvia o tamborilar de seus pingos no telhado.  A menina já cansada de ficar dentro da casa espiava pela janela. Às vezes, quando a chuva diminuía, parecia que entre uma nuvem e outra brotava uma frestinha de sol, mas ai o céu se movia todo e apagava a esperança. O gato dormia pesadamente sobre o sofá. A mãe ninava o irmãozinho no quarto quieto. Só o ponteiro do relógio quebrava o silêncio, minuto a minuto... Mas as horas não passavam. . .Sentia dó do abacateiro, que encharcado lá fora tremulava de frio. Contava lentamente as poças d’água que iam se formando no quintal. E o tempo não passava.  A pressa sempre fora um grave defeito da menina, agora acelerava o seu coraçãozinho e lhe fazia ter suspeitas terríveis: talvez aquela tarde nunca acabasse. Talvez a morosidade do tempo fosse um labirinto, uma armadilha para que não brincasse mais, e até para que não crescesse.
 
Epílogo
Sinto pena em dizer, que a pressa da menina a impediu de viver grandes aventuras, de navegar para além do horizonte e desbravar mares distantes. E ela foi só um miniconto teimoso de verbos parados.